Imagem: tela de Ary Salles
No ano de 1910, durante uma conferência na Dinamarca, ficou decidido que o 8 de março passaria a ser o Dia Internacional da Mulher, em homenagem as 130 tecelãs que morreram em 1857, numa fábrica, em Nova York. Somente no ano de 1975, por meio de um decreto, a data foi oficializada pela Organização das Nações Unidas (ONU).
Para homenagear as 130 tecelãs, penso em um nome da literatura universal; um nome que é símbolo da história da mulher no Brasil e do papel da mulher na sociedade.
Penso em Cora Coralina (20/08/1889 – 10/04/1985+), pseudônimo de Ana Lins dos Guimarães Peixoto Bretas - poeta e contista brasileira. Coralina publicou seu primeiro livro aos 76 anos de idade. Mulher simples, doceira, ela viveu longe dos grandes centros urbanos. Alheia a modismos literários, produziu uma obra poética rica em motivos do cotidiano do interior brasileiro.
Penso também nas minhas filhas Ana e Agnes e no meu filho Fabiano: os três cresceram ouvindo as “estórias da casa velha da ponte”; penso em minha mãe Noemia – que me ensinou a costurar os dias e, em todas as mulheres da minha família - minha tia Fisa que acolhia em seu hotel (o primeiro hotel de São José do Campestre/RN) os romeiros de "Padim Ciço" e em minha avó Conceição Amador cujo semblante me lembrava o doce rosto de Coralina.
Para repensar esse dia, tomo a liberdade de apresentar dois poemas de Coralina: “Das pedras” e o “Chamado das pedras” (In: Meu livro de cordel) e mais a tela pintada por Ary Salles que retratou muito bem a imagem da nossa Cora Coralina – poeta dos becos de Goiás.
Para repensar esse dia, tomo a liberdade de apresentar dois poemas de Coralina: “Das pedras” e o “Chamado das pedras” (In: Meu livro de cordel) e mais a tela pintada por Ary Salles que retratou muito bem a imagem da nossa Cora Coralina – poeta dos becos de Goiás.
Cerrado de Brasília/DF, 7 de março de 2011.
Graça Graúna
Das pedras
que vieram sobre mim.
Levantei uma escada muito alta
e no alto subi.
Teci um tapete floreado
e no sonho me perdi.
Uma estrada,
um leito
uma casa,
um companheiro.
Tudo de pedra.
Entre pedras
cresceu a minha poesia.
Minha vida...
Quebrando pedras
e plantando flores.
Entre pedras que me esmagavam
Levantei a pedra rude
dos meus versos.
(Cora Coralina. Meu Livro de Cordel, p.13, 1998)
O chamado das pedras
A estrada está deserta.
Vou caminhando sozinha.
Ninguém me espera no caminho.
Ninguém acende a luz.
A velha candeia de azeite
de lá muito se apagou.
Vou caminhando sozinha.
Ninguém me espera no caminho.
Ninguém acende a luz.
A velha candeia de azeite
de lá muito se apagou.
Tudo deserto.
A longa caminhada.
A longa noite escura.
Ninguém me estende a mão.
E as mãos atiram pedras.
Sozinha...
A longa caminhada.
A longa noite escura.
Ninguém me estende a mão.
E as mãos atiram pedras.
Sozinha...
Errada a estrada.
No frio, no escuro, no abandono.
Tateio em volta e procuro a luz.
Meus olhos estão fechados.
Meus olhos estão cegos.
Vêm do passado.
No frio, no escuro, no abandono.
Tateio em volta e procuro a luz.
Meus olhos estão fechados.
Meus olhos estão cegos.
Vêm do passado.
Num bramido de dor.
Num espasmo de agonia
Ouço um vagido de criança.
É meu filho que acaba de nascer.
Num espasmo de agonia
Ouço um vagido de criança.
É meu filho que acaba de nascer.
Sozinha...
Na estrada deserta,
Sempre a procurar
o perdido tempo que ficou pra trás.
Na estrada deserta,
Sempre a procurar
o perdido tempo que ficou pra trás.
Do perdido tempo.
Do passado tempo
escuto a voz das pedras:
Do passado tempo
escuto a voz das pedras:
Volta...Volta...Volta...
E os morros abriam para mim
Imensos braços vegetais.
E os morros abriam para mim
Imensos braços vegetais.
E os sinos das igrejas
Que ouvia na distância
Diziam: Vem... Vem... Vem...
Que ouvia na distância
Diziam: Vem... Vem... Vem...
E as rolinhas fogo-pagou
Das velhas cumeeiras:
Porque não voltou...
Porque não voltou...
E a água do rio que corria
Chamava...chamava...Vestida de cabelos brancos
Voltei sozinha à velha casa deserta.
Das velhas cumeeiras:
Porque não voltou...
Porque não voltou...
E a água do rio que corria
Chamava...chamava...Vestida de cabelos brancos
Voltei sozinha à velha casa deserta.
(Cora Coralina. Meu Livro de Cordel, p.84, 8°ed., 1998)
8 comentários:
Beleza de postagem, minha amiga.
Existem mulheres capazes de transformar pedras em flores.
Feliz 8 de março!
Edifica sobre a pedra, ensinou Cristo. A mulher aprendeu.
Parabéns, Graça.
Sonia, poetamiga: feliz 8 de março pra você que também sabe transformar pedras em flores. Grata pela leitura. Paz e bem, Graça Graúna
Mueu querido poeta Carlos Brandão: Cristo é, será sempre o nosso Grande Mestre. Grata pela leitura em torno dos poemas de pedra de Coralina. No mais, e entre pedras e flores vou aprendendo. Grata pela leitura. Paz e bem, Graça Grauna
Graça, você me fez lembrar tantas mulheres, minha mãe, que veio de Petrolina, minhas irmãs, mulheres de fibra, enfim... gostei muito da homenagem às mulheres brasileiras no nome de Cora Coralina, não poderíamos ter exemplo maior ou melhor!
Diacui, minha querida irmã de luta: é um honra contar com a sua presença no meu blog. Fico feliz que tenha gostado dos meus escritos acerca de Coralina. Grata pela atenção, pelo carinhos. Bjos de luz,
Graça Graúna
Bom ler sobre o Dia das Mulheres nas palavras de um grande exemplo delas. Muito orgulho de ser tua filha.
Só por curiosidade, fiquei sabendo que dia 8 de março também é o aniversário de Maria Bonita, companheira de Lampião:)
Agnes: imagina só a força do tempo... Agora que você falou é que me lembrei. Fico devendo mais referência à Maria Bonita. A proposito, tua lembrança em torno dela é uma forma de homenagear a grande dama do cangaço. Eita, mulé cabra da peste! Valeu a leitura, Agnes. Eu também tenho um grande orgulho de ser a sua mãe. Bençãos e beijos de luz, Mainha
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