O meu gosto pelos versos nasceu quando eu tinha seis ou sete anos, quando minha mãe leu para mim um poema a respeito de uma menina que queria ser enfermeira de Jesus. Declamei o poema num circo mambembe.
Lembro das muitas ocasiões em que eu declamava para as visitas que chegavam na pequena Hospedaria de Tia Fisa. Parte da minha infância vivi com Tia Fisa. Ela hospedava feirantes, caixeiros viajantes, romeiros e outros religiosos que acompanhavam Frei Damião e viajavam pra Juazeiro pedir chuva ao “Padrim Ciço”...
Eu sabia o poema de cor e salteado. Hoje trago na memória apenas o ritmo de algumas palavras que falavam de uma menina chamada Ritinha.
Do autor ou da autora do poema, não me recordo o nome; mas compartilho alguns trechos do poema intitulado “Enfermeira de Jesus”. Alguns versos talvez sejam parte também do meu imaginário de criança, mas vale a tentativa de registrar, aqui, o ritmo da palavra e a grande façanha de uma menina que sonhou em aliviar as dores do amigo Jesus.
Enfermeira de Jesus
Encontrando a porta aberta
Ligeirinha e muita esperta
Sem ninguém para conter
Entrou a linda Ritinha
No quarto da mamãezinha
Para tudo então mexer
Vendo em cima [lá no alto]
O Jesus crucificado
Pôs a mão no coração.
Arrastou um escada
Pegou um esparadrapo
Um pedacinho de trapo
Um copo d’água e algodão
(...)
Quando a mãe entrou no quarto
Brigou com a linda Ritinha
Que foi descendo a escada
E logo assim respondeu:
Veja mamãe como eu sei
Pois eu sozinha curei
Todo dodói de Jesus
Nas minhas constantes viagens entre o Agreste e o Litoral pernambucano, aqui e acolá avisto um circo mambembe. Na semana passada, vi um circo bem pobrezinho na beira da estrada e logo veio à memória um dos momentos especiais da minha infância, quando declamei “Enfermeira de Jesus” no maior circo que apareceu no meu lugarejo; hoje tenho noção que não parecia tão grande assim, mas era o maior circo de todos os tempos na minha recordação de infância.
Lembro até do vestido que eu usava: era branco, bordado, laço na cintura. Lembro até dos carões que eu levava pra pentear os cabelos e minha mãe dizia: como pode uma menina com uma roupa tão bonita declamar um poema com os cabelos despenteados? Mas não adiantava reclamar. Só sei que ainda guardo o cheiro da brilhantina na minha franja; lembro da luz meio laranja sobre mim no picadeiro. Eu, sentadinha em um banco colorido, toda prosa e ciente que todos naquela noite de sábado ouviam minha voz miúda no auto falante da cidade.
Foi assim que dei conta do senso poético ao declamar sobre a liberdade de uma porta aberta e nessa direção a palavra mambembe sem ninguém para conter.
Graça GraúnaNordeste do Brasil, 3 de novembro de 2009
Lembro das muitas ocasiões em que eu declamava para as visitas que chegavam na pequena Hospedaria de Tia Fisa. Parte da minha infância vivi com Tia Fisa. Ela hospedava feirantes, caixeiros viajantes, romeiros e outros religiosos que acompanhavam Frei Damião e viajavam pra Juazeiro pedir chuva ao “Padrim Ciço”...
Eu sabia o poema de cor e salteado. Hoje trago na memória apenas o ritmo de algumas palavras que falavam de uma menina chamada Ritinha.
Do autor ou da autora do poema, não me recordo o nome; mas compartilho alguns trechos do poema intitulado “Enfermeira de Jesus”. Alguns versos talvez sejam parte também do meu imaginário de criança, mas vale a tentativa de registrar, aqui, o ritmo da palavra e a grande façanha de uma menina que sonhou em aliviar as dores do amigo Jesus.
Enfermeira de Jesus
Encontrando a porta aberta
Ligeirinha e muita esperta
Sem ninguém para conter
Entrou a linda Ritinha
No quarto da mamãezinha
Para tudo então mexer
Vendo em cima [lá no alto]
O Jesus crucificado
Pôs a mão no coração.
Arrastou um escada
Pegou um esparadrapo
Um pedacinho de trapo
Um copo d’água e algodão
(...)
Quando a mãe entrou no quarto
Brigou com a linda Ritinha
Que foi descendo a escada
E logo assim respondeu:
Veja mamãe como eu sei
Pois eu sozinha curei
Todo dodói de Jesus
Nas minhas constantes viagens entre o Agreste e o Litoral pernambucano, aqui e acolá avisto um circo mambembe. Na semana passada, vi um circo bem pobrezinho na beira da estrada e logo veio à memória um dos momentos especiais da minha infância, quando declamei “Enfermeira de Jesus” no maior circo que apareceu no meu lugarejo; hoje tenho noção que não parecia tão grande assim, mas era o maior circo de todos os tempos na minha recordação de infância.
Lembro até do vestido que eu usava: era branco, bordado, laço na cintura. Lembro até dos carões que eu levava pra pentear os cabelos e minha mãe dizia: como pode uma menina com uma roupa tão bonita declamar um poema com os cabelos despenteados? Mas não adiantava reclamar. Só sei que ainda guardo o cheiro da brilhantina na minha franja; lembro da luz meio laranja sobre mim no picadeiro. Eu, sentadinha em um banco colorido, toda prosa e ciente que todos naquela noite de sábado ouviam minha voz miúda no auto falante da cidade.
Foi assim que dei conta do senso poético ao declamar sobre a liberdade de uma porta aberta e nessa direção a palavra mambembe sem ninguém para conter.
Graça GraúnaNordeste do Brasil, 3 de novembro de 2009
8 comentários:
Olá, Graça!
Me lembro de você do Overmundo... você, Marcos Pontes, Compulsão Diária... os maiores de lá e de sempre!
Parabéns pelo blog, tem um belo template e ótimos textos...
Sou acadêmico de Letras-Inglês na UFMT e há 1 ano e "escrevo" há 2. Tenho um blog com alguns textos postados e tenho recebido cascudos de incentivo para divulgar o meu espaço, então, venho humildemente à tua morada deixar um singelo link para o meu blogzinho:
http://turbilhaopsicodelico.blogspot.com
Espero sua visita, e também espero que aprecie. Se não gostar, solte o verbo. Quem escreve dá a cara aos tapas, socos, pontapés, e quem não apanha não evolui.
Obrigado.
Querido Rudny - grata pela calorosa e poética visita. Volte sempre. Fico feliz pela alembrança que tem de mim ao lado dos queridos Marcos Ponta e Compulsão Diária. Paz em Ñanderu, Grauninha
Um comentário da minha ilha Ana, pelo yahoo.
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Oi mainha,
Adorei sua poesia mambembe.
Engraçado como o mundo do circo fica mesmo em nosso imaginário...
Algumas vezes até gostamos mais de nossa imaginação circense do que a realidade não é?
Mas, quando a lembrança de infância se mistura à fantasia do circo, tudo parece mágico (lembro da gente brincando de circo na varanda).
Já tentou passar essa lembrança pra aquarela?
Dá uma boa tela, não dá?
beijos e saudades,
Ana
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CORRIGINDO:
Querido Rudny - grata pela calorosa e poética visita. Volte sempre. Fico feliz pela alembrança que tem de mim ao lado dos queridos Marcos Pontes e Compulsão Diária. Paz em Ñanderu, Grauninha
Linda história... eu não sei, o que é um circo "mambembe"?
Você tem uma ótima memória! Guardar esses versos por tanto tempo... nossa!
Deve ser também por ter sido uma experiência tão marcante - e saborosa - dos seus tempos de infância, os melhores, sempre.
Abraço, Graça.
Meu querido Rudny: veja quanta riqueza traz o significado de mambembe; em Houaiss, temos: 1) localidade afastada, desabitada; 2) teatro ambulante, individuo sem valor; 3) mediocre; 4) abandono, solidão, abandondo, isolado.
Bjos, Grauninha
Graúna !...nossa vida é mambembe, né mesmo ?...rs
Essas lembranças, são como tranças
se misturam e criam um belo caminho...
excelente, querida amiga !
um beijo
Meu querido Joe: é grande a minha alegria em recebe-lo aqui, neste espaço mambembe. Grata por existir. Bjos, Grauninha
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