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31 janeiro 2009

Fragmento



Texto: Graça Graúna
Arte: Gilia Gerling
Publicado no blogilia, em 30.jul.2008

30 janeiro 2009

Crianças de Angola

Imagem Google. Sombras da guerra, de Carlos Pires (Angola)

(Ao poeta angolano Arlindo Barbeitos)

Naquele tempo
as crianças cantavam
na altura dos sonhos
o de mais sagrado

“por esta rua, ó domine
passeou meu bem, ó domine”

Quando as granadas
adormecem o vento
um coro de anjos
dentro da noite
tece o encanto
no tempo sem tempo

“por esta rua, ó domine
passeou meu bem ó domine
orai por mim, ó domine
e por mais alguém, ó dominé”


Por esta rua,
crianças de Angola
brincam de roda
numa perna só


Graça Graúna. Tessituras da terra. Belo Horizonte: Edições M.E Alternativa, 2001, p. 23.

29 janeiro 2009

Mais um prêmio




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Quase-haikai IV


Imagem Google: muiraquitã

Do fundo do lago
resgato o verde do barro:

muiraquitã


Graça Graúna, Nordeste do Brasil, 29.jan.2007

28 janeiro 2009

Quase-haikai III

Imagem Google. Amantes, por Nicoletta Tomas


A vida se renova:
quando perto estás
muito mais enloucresço


Graça Grauna, Nordeste do Brasil, 28.jan.2009

25 janeiro 2009

Canto submerso

Imagem Google. Moça na janela, de Salvador Dali.


...se a água em que me deito
é a mesma que te banha,
porquê não ouvir a voz do aflito mar?
- Carpe Diem!Aproveite o dia!

Mas veio a onda de mar levado
e deitou seus búzios
ao meu amado
agora e para sempre
submerso na paisagem marinha


Graça Graúna, Nordeste do Brasil, 25.jan.2009

19 janeiro 2009

Entre-lugar

Don Quixote, Salvador Dali - 1971.

De um lado
a palavra
do outro
o silêncio
estreando realidades conhecidas.

A pá lavra o abismo
que vai de mim
ao outro

Graça Graúna. Tear da palavra. Belo Horizonte: M.E.Edições Alternativas, 2007, p. 20

Reverso do cárcere

Ilustração: Fabiano Sobreira

(para Osman Lins)


Na alta madrugada
o coro entoava
estamos todos aqui

no ofício de ser
criador
criatura
traçando
tecendo das circunstâncias
vertentes

assim, torno a ver
no reverso do cárcere
o lado negro e cru
do ofício de escrever


Graça Graúna. Tessituras da terra. Belo Horizonte: M.E. Alternativas, 2001, p. 36.

17 janeiro 2009

Poesia da ladeira

Imagem Google. Festa de N.S. Rosário


Ó Senhora do Rosário
ó Dona Santa guerreira
lua crescente formosa
ó Menininha dos pretos
uni meus irmãos
dispersos na ladeira

Ó Dona Santa guerreira
Senhora Dama-do-paço
estrela das mais brilhantes
poesia da vida inteira
uni meus irmãos
dispersos na ladeira

Graça Graúna. Tessituras da terra. Belo Horizonte: M.E. Alternativas, 2001, p. 18.

Nota: para saber mais visite a página sobre a
Irmandade do Rosário dos Homens Pretos.

11 janeiro 2009

Na altura dos sonhos

...um homem, uma mulher. Imagem Google



direi que é domingo
se a tua alma vem
desnuda, cantante
apascentar meus temores

agora e na hora

direi que é domingo
que haverá manhã
na altura dos sonhos
na hora última dos namorados


Graça Graúna. Tessituras da terra. Belo Horizonte: M.E. Edições Alternativas - Coleção Milênio, 2001, p. 34.

No site Overmundo, este poema recebeu 183 votos

08 janeiro 2009

Performance





Clepsidra. Imagem Google


O dia convida à leitura das águas
da chuva e do mar
da saudade doida e doída
dos meus dias paulistanos

Permito-me os excessos de amar
de abraçar exageradamente o outro
de olhar nos olhos
de mostrar-me nua-quase.

Leio a vida
que passa entre os trilhos
e as marcas de bala
nas janelas dos ônibus.

O dia convida a viver....sobreviver...
a não esquecer que a saída
um tango pode ser
como quer Bandeira

O dia convida a escreviver asneiras
assim, pela vida
e abraçar o outro
de-va-ga-ro-sa-men-te

Graça Graúna, Nordeste do Brasil, 27.ago.2008

Nota: poema publicado no site Overmundo

03 janeiro 2009

Crônica para um narrador



Imagem Google

Foi num sábado à noite. No local do encontro, mesclas do infinito; coisas que acontecem, quando as lembranças se transformam em festa com as boas palavras de Antonio Viana: um escritor.
A sala estava cheia. Adultos e crianças em meio ao encanto. Ao meu lado, um casal idoso deu-me a impressão de que não perdera o hábito de ouvir “Músicas e lágrimas”, de Glen Miller. Ele, muito discreto, guarda uma semelhança com aqueles homens desenhados nos reclames coloridos dos cigarros americanos de 1932. Ela, provavelmente da mesma época e exuberante no vestido de seda azul claro, me deixou também a impressão de que acabara de sair de um quadro em moldura oval, desses que ocupam um lugar muito especial em uma sala grande. Não sei a cor dos seus olhos; se azuis, ou castanhos; traços do rosto que eu quase desconheço. O tom da voz, eu não sei. Na verdade, procurei resguardar minha curiosidade sobre o casal para não quebrar o encanto. Coisas de leitor, de leitora: primeiro, o livro. Depois, o filme.
História & histórias. Ficção e realidade. Ah, os livros! Na passagem para o poético, um festim de personagens: Pessoa e pessoas, Alberto, Francelina, Luzilá, Rilke, Abigail, Victor Hugo, Neruda, Lorca, Whitman, quase todos os nomes no espaço sedutor – o texto. E o leitor como se sentem? Certamente, desejoso também de exercitar no seu ritmo algumas lembranças. Engraçado, eu nem me lembrava mais da experiência de sentir, à maneira de Viana e Drummond, essa prévia saudade de ler um livro. Não foi à toa que eu me guardei na minha ânsia, diante da tentação de folhear uma das gêneses da obra. Bom mesmo é esperar o momento certo para abraçar o livro. E o autor? Sim, é permitido abraça-lo também; porque as boas lembranças aquecem. E o narrador, onde está? Em meio à ânsia coletiva, como geralmente ocorre em lançamento de livro; está na “fronteira entre o histórico, a ficção e o memorialismo”, como dizem os teóricos.
Fez-se um rápido silêncio. Eis o Autor! - disse um amigo. Ao meu lado, um casal idoso contemplava o homem quase-menino que acabara de chegar. Nesse momento, duas sábias mulheres se aproximaram e contaram histórias sobre os muitos caminhos desse homem: cidadão do mundo, filho da ausência, irmão da confiança, habitante também de Pasárgada.
Bastou essa palavra: Pasárgada! E abriu-se uma porta mágica. Através dela, o Autor foi chegando manso, tranqüilo, cobrindo a todos com um raio de luz. Sobre a mesa, lembranças em papel e tinta evocam o ad-infinito.


Graça Graúna, Solar da Serra/DF, 3 de janeiro de 2009.
Nota: no site Overmundo, este poema recebeu 214 votos.


Graça Graúna. Crônica para um narrador. In: BARRETO, R. Paes (Org.). Opúsculo de múltiplas vozes sobre o Festim das lembranças, de Antonio Viana. Recife: Cia. Pacífica, 1999, p. 37-38.